“Defasagem genética !!!!!” : a tilapicultura brasileira diante de um grande desafio.

Onde nós estamos???

Dr. Carlos Antonio Lopes de Oliveira

Dr. Ricardo Pereira Ribeiro

Ao observar os diversos elos da cadeia da tilapicultura brasileira, existem vários agentes envolvidos no desenvolvimento e disseminação de genética de qualidade. Alguns atores estão envolvidos com a determinação dos objetivos de melhoramento, identificando e relacionando quais os aspectos produtivos que deveriam ser selecionados para aumentar o retorno econômico (velocidade de crescimento, rendimento de cortes comerciais, padronização, resistência a patógenos,…), outros estão envolvidos na produção e disseminação dos animais melhorados e há aqueles que utilizam e avaliam as variedades disponibilizadas, retroalimentando o sistema de informações para determinação de novos objetivos e ou correção de rota. 

Considerando isto, é possível afirmar que a produção de formas jovens com a qualidade desejada, é o grande entroncamento da genética de tilápias. Nos alevinocultores estão estocados os recursos genéticos disponíveis para toda a cadeia produtiva de tilápias, a qual no Brasil, estima-se hoje em torno de 650 milhões de alevinos por ano. Dessa forma, sobre eles paira a necessidade/incumbência de manutenção da qualidade genética, por meio da reposição adequada dos reprodutores.

Para atender a essa demanda, os alevinocultores podem produzir a própria reposição ou adquirir os reprodutores de núcleos de multiplicação e produção de material genético melhorado. Porém, produzir seus próprios reprodutores exige uma série de conhecimentos e conceitos, tornando essa prática, em nível de produtor, quase impossível de ser realizada com sucesso e sustentabilidade ao longo de várias gerações.

Em ambas as situações (produção própria ou aquisição de matrizes), existe a necessidade de identificar quais são os objetivos econômicos de melhoramento pelos quais se pratica a seleção. Definidos estes objetivos, cabe aos produtores de material genético, estabelecer a forma de condução do programa de melhoramento genético para reposição dos reprodutores, diante disso, alguns questionamentos devem ser considerados.

– Haverá avaliação em múltiplas condições de cultivo?

Neste contexto é necessário levar em consideração em que condições o material genético disponibilizado será cultivado, se as condições de cultivo são diversas o suficiente ao ponto de demandarem o desenvolvimento de linhas genéticas específicas para cada condição. Nestas situações, a sugestão é trabalhar com um único núcleo de seleção, avaliado nos vários locais/sistemas de cultivo, gerando matrizes para cada condição específica, se for o caso, porém é essencial ter em mente que o uso de reprodutores melhorados em programas bem conduzidos é mais eficiente, em termos de produtividade na engorda, do que utilizar animais não melhorados em qualquer condição de cultivo e é aí que a maioria erra, achando que é autossuficiente em genética, mesmo que seus animais apresentem boa adaptação ao sistema de cultivo esse é um caminho equivocado.

Equívocos comuns diante deste quadro são, imaginar que qualquer animal melhorado atende às mais diversas condições de cultivo, ou pensar que o aumento do desempenho ou ganho com melhoramento genético em uma condição não seja aplicável/compatível em outra condição distinta, com destacado acima.

– Na seleção dos animais serão utilizadas ou não as informações de parentesco?

Este ponto trata, da utilização de recursos de identificação individual e controle genealógico dos animais em avaliação. Resultados apontam que o uso das informações de parentes na avaliação genética, incrementam a exatidão com que são identificados os animais com maior potencial genético, pois além da própria informação, existem dados adicionais vindos dos pais, irmãos, primos, etc… que reafirmam a qualidade genética ou não dos candidatos à seleção.

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– Quais serão os mecanismos de conservação da variabilidade genética e quais são as medidas de controle da consaguinidade?

O cuidado com estes dois pontos (manutenção da variabilidade genética e endogamia) são determinantes na sustentabilidade de programas de melhoramento genético. Os aumentos das taxas de consanguinidade tendem a reduzir a variabilidade genética, impactando a resposta à seleção, diminuindo o incremento do ganho geracional, principalmente pelo aumento da padronização no núcleo de seleção, devido ao aumento do parentesco médio dos animais avaliados. Esse é o principal ponto de erro que incorrem os produtores de alevinos que tentam produzir sua própria reposição, obtém bom ganho em uma ou duas gerações e perdem seu programa na sequência, devido à elevada consanguinidade.

A manutenção de níveis elevados de variabilidade genética no núcleo de seleção, não é incompatível com o aumento da padronização na linha comercial. A manutenção de variabilidade no núcleo se maneja por meio de acasalamentos que visem otimização da resposta à seleção com manutenção da consanguinidade em níveis aceitáveis. Para produção dos reprodutores comerciais, a elevada capacidade reprodutiva da tilapia é um grande aliado, pois, permite produzir um grande número de matrizes, a partir de acasalamentos dirigidos/controlados de um grupo menor de animais com elevado potencial genético (avós), o resultado é uma linha comercial com elevado desempenho e padronização.

– Como será mensurado o ganho genético ou a resposta à seleção? 

Em linhas gerais, a resposta à seleção é resultado de três fatores, a intensidade da seleção (relação candidato/vaga, quanto maior o número de animais avaliados em relação ao número de possíveis reprodutores, mais intensa será a seleção), a variabilidade genética (quão diferentes são os indivíduos avaliados e quanto desta diferença é de ordem genética) e a acurácia/exatidão com que se identifica os animais geneticamente superiores. A maximização destes três fatores resulta em elevado progresso genético de uma geração para outra. Em tilápias temos ganhos genéticos muito significativos, cerca de 3 a 4% por geração no Núcleo e mais de 9% por geração nos reprodutores comerciais.

Diante dos pontos tratados acima, um processo de complexidade razoável se apresenta para produção de material genético melhorado, e sobre os alevinocultores pesa uma responsabilidade muito grande, um fardo demasiado pesado, principalmente para aqueles de pequeno e médio porte. Pois os investimentos nas estruturas de manutenção e multiplicação dos animais, os custos relativos aos recursos humanos para realização da avaliação genética, seleção e definição dos acasalamentos, representariam um percentual elevado do lucro desses alevinocultores.

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Às grandes empresas de produção de formas jovens, os investimentos para o desenvolvimento de programas de melhoramento são mandatórios, de maneira que poderão desenvolver linhas genéticas e comercializá-las para o setor produtivo (engordadores). Além disso, existe a possibilidade de distribuição de matrizes para os demais alevinocultores, porém devido a uma questão de escala, a comercialização de formas jovens apresenta maior retorno econômico que a venda de matrizes, este pode ser um fator decisivo na escolha de fornecer reprodutores aos demais produtores de alevinos. 

Aos pequenos e médios alevinocultores a associação com instituições que desenvolvam programas de melhoramento, talvez seja a alternativa mais barata e eficiente para obtenção de matrizes melhoradas. Para explorar esta possibilidade, é necessário que os alevinocultores averiguem se as instituições/empresas, que disponibilizam material genético, possuam programas de melhoramento utilizando as informações individuais e de famílias, se os métodos de avaliação genética utilizados são baseados nesta combinação destas informações, também devem verificar, se há controle do incremento da consaguinidade e avaliação do ganho genético geracional,  e por fim, observar se há aplicação de protocolos sanitários para evitar a disseminação de doenças.

Com base no exposto, entendemos que para diminuição da “defasagem genética” da tilapicultura brasileira em relação à mundial, existe a necessidade de aumentar os esforços para o desenvolvimento e manutenção de programas de melhoramento genético locais, deve haver aumento do estímulo da reposição adequada dos planteis de reprodutores, com substituição contínua por animais geneticamente superiores, o ideal seria uma reposição anual dos planteis, de modo a diminuir a distância entre os resultados do Programa de melhoramento e a produção comercial, e deve ser estimulado o constante diálogo entre os  diversos elos da cadeia produtiva, para apontar quais rumos devem ser tomados pelo programas de melhoramento, para que haja disseminação de uma genética que torne a tilapicultura brasileira ainda mais competitiva. Um outro efeito que muitos têm repetido muito ultimamente que é a necessidade de importação constante de material genético, não que isso não possa ocorrer, mas programas bem conduzidos, possuem alto controle das taxas de consanguinidade ao longo das gerações e por isso mantém alta variabilidade genética em seus Núcleos de Seleção, fazendo com que essa prática de trazer novos genótipos seja uma necessidade secundária.

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Desse modo, finalizamos este texto, afirmando que temos material genético de qualidade no Brasil e programas de melhoramento confiáveis e consistentes.  Temos convicção que precisamos melhorar a aproximação entre os atores envolvidos nesse processo, para que o acesso a esse material genético ocorra de forma rápida, fluindo dos programas de melhoramento até o produtor que engorda seu peixe.

Obrigado por ter lido até aqui, dúvidas, questionamentos, comentários, nos envie nos e-mails abaixo ou pelas mídias sociais.

Carlos Oliveira – caloliveira@uem.br – @caloliveira.peixegen
caloliveira@uem.br
Doutor – Zootecnista
Professor Associado do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá
Doutor em Zootecnia – Melhoramento Genético Animal
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ricardopeixegen
Possui graduação em Zootecnia pela Universidade Estadual de Maringá (1987), mestrado em Genética e Melhoramento Animal pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1992) e doutorado em Ecologia pela Universidade Estadual de Maringá (1999). Atualmente é Professor Associado do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá.
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3 comentários em ““Defasagem genética !!!!!” : a tilapicultura brasileira diante de um grande desafio.

  1. Gostaria de saber que rumo tomara a tilapicultura brasileira com a compra da Aquamerica pela Genomar

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    1. Essa aquisição mostra a força da Piscicultura Brasileira, porém pode ser o início de uma mopolização do fornecimento de genética no país, pois assim que a produção de alevinos puder ser totalmente abastecida por essa empresa e os demais produtores de alevinos não tiverem qualidade similar, ela pode dominar esse mercado sozinha. Então, é muito importante os demais produtores de alevinos despertarem para investimentos em genética, pois podem sucumbir

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  2. Antônio Mauro Ferreira 10 de maio de 2020 — 19:38

    Materia muito interessante. Parabéns pela observação relevante e esclarecedora.

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