PERSPECTIVAS PARA A PISCICULTURA NO BRASIL EM TEMPOS DE CRISE – O QUE PODEMOS ESPERAR OPINIÃO – Ricardo Pereira Ribeiro

Recentemente escrevi sobre a crise que abala o Setor de Piscicultura do Brasil desde meados de maio de 2018, esta crise tem muitas causas, entre elas, as principais, a redução do preço da carne do frango no Brasil, em virtude do embargo europeu no início do ano, o que fez com que os estoques se acumulassem nas câmaras frias dos principais produtores; a greve dos caminhoneiros, em maio, também agravou esta situação, dificultando ainda mais o já complicado escoamento do produto que estava acumulado, isso já foi abordado em nossa última publicação em janeiro último. Porém o mercado é dinâmico e muita coisa ocorreu de lá para cá. Isso além dos impactos negativos que já tem causado no mercado do peixe como o excesso de oferta de peixe gordo, fazendo com que muitos produtores deixassem de povoar os tanques com alevinos aumentando seus custos de produção e consequentemente fazendo com que mesmo se houver a demanda por peixe gordo, os preços ofertados não cobrem os custos de produção.

Por outro lado, na outra ponta da Cadeia, o varejo tem mantido as margens de lucro, parecendo insensível ao que ocorre no Campo, mesmo havendo resistência do consumidor em manter os mesmos índices de consumo, pois este simplesmente se adapta e substitui o que vai comprar, optando pelo produto mais barato.

O brasileiro come pescado, como já abordamos, o Brasil importa mais de US$ 1 bilhão anuais em pescados, segundo dados do Ministério da Industria e Comércio, boa parte deste pescado é de peixe barato, sardinha, merluza, polaca do Alasca, panga, entre outros, ou seja se não pode consumir os produtos de pescado mais caros, a grande maioria opta pelos produtos mais baratos e nesse cenário o nosso peixe de cultivo e seus produtos vão sendo deixados de lado pelo consumidor descapitalizado.

Isso pode ser confirmado pelos dados das importações de pescado em 2018, a importação de merluza pelo Brasil aumentou cerca de 4,9% no ano passado e um fato muito importante também ocorreu com o Salmão, pois com a redução de cerca de 20% do preço internacional deste produto, o Brasil importou cerca de 17% mais salmão em 2018 do que em 2017, porém com uma redução de cerca de 6,6% no volume de recursos envolvidos (www.foodnewsoficial/mercado/importacao-de-pescados), ou seja, estes fatos comprovam que o brasileiro come peixe, porém procura diversidade de produtos e preço, portanto nós da Piscicultura temos que estar atentos a estes aspectos, pois mesmo com este aumento das importações estamos presenciando uma crise de mercado interno para os peixes de cultivo, a qual segundo o Presidente Executivo da PeixeBR, Dr. Francisco Medeiros se deve a, no caso da tilápia a uma oferta maior do que o mercado consegue absorver, ou seja, o mercado cresceu 10% e a produção 11,9% e, no caso do nativo o problema foi decorrente de problemas sanitários no Amazonas, remuneração baixa em RO e MT em 2017 com consequente redução de povoamento em 2018, o que levando o produto a ter bom preço hoje. Então o brasileiro está consumindo cada vez mais peixe e a Pisicultura brasileira enfrenta uma crise de mercado, um paradoxo!!!!!

Na tilapicultura nosso quase monolítico mercado de filé fresco e congelado nos deixa de mãos atadas para combater este quadro, pois o baixo aproveitamento do produto eleva significativamente os custos para os processadores impedindo que possam pagar mais para os produtores sem comprometimento de suas margens, muitas indústrias já perceberam isso e já estão cuidando do desenvolvimento de novos produtos visando ampliar sua competitividade. Já temos um produto industrializado da tilápia competitivo no mercado, a posta da tilápia (preço médio do Kg no varejo no Paraná R$ 15,78 – fev/2018), corte muito saboroso e com níveis de preço similar ao da coxinha da asa do frango (preço médio no varejo no Paraná R$ 12,23 – fev/2018), corte com alto índice de aproveitamento da carcaça, bom preço, menor complexidade de processo de processamento, demonstrando que temos espaço para competir com o pescado importado e com outras cadeias de proteína animal. O desenvolvimento de produtos e aumento do aproveitamento pode ser a saída para atrair a fidelidade do consumidor aos nossos produtos e, é claro, um programa de marketing bem elaborado e bem conduzido serão as chaves para a consolidação de nosso mercado junto a população.

É claro que o filé de tilápia é um grande produto e já conquistou um espaço cativo no mercado e caiu no gosto da população, mas sozinho, pensando em mercado interno, talvez não suporte o crescimento da atividade que vem num ritmo alucinante de 8 a 10% ao ano nos últimos 10 anos, pelo menos, e queremos que este ritmo perdure por muito mais tempo, tornando o Brasil o terceiro maior produtor de tilápias do mundo e um grande exportador de peixe de cultivo.

“Como ganhar dinheiro na piscicultura. Quais são os segredos da gestão descomplicada em nossa atividade?”. Em agosto de 2017 tivemos uma escassez na oferta de alevinos devido a grande liquidez deste mercado e a grande expansão das áreas de engorda impulsionadas pelo otimismo que imperava naquele período de franca expansão. Havia já um bom número de produtores de alevinos, porém a grande maioria não estava preparada para o grande aumento da demanda, somando-se a isso este é o período da entressafra nas regiões sul e sudeste e a maioria dos grandes produtores estavam concentrados nestas regiões. Por fim, estima-se que só na região Centro Sul do Brasil naquele ano houve uma falta de, pelo menos 30 milhões de alevinos de tilápias.

É claro num cenário desses a euforia toma conta e temas como genética e qualidade ficam em segundo plano, tudo que se produz vende. Finalizamos o ano de 2017 com uma safra recorde, segundo a PeixeBR, mais de 691 mil toneladas de peixes produzidos destes 357 mil toneladas de tilápias e, enquanto eu estava escrevendo este texto os dados de 2018 estavam sendo publicados pela PeixeBR, tivemos um aumento de 4,5% na produção total, somando mais de 722 mil toneladas de peixe produzido em nossa Piscicultura, deste total 400.280 ton, de Tilápias, consolidando o Brasil como o quarto maior produtor mundial. Porém, pelos fatores já descritos anteriormente e em outra publicação o mercado em 2018 e no início de 2019 tem se comportado de forma oposta e agora o foco na gestão, planejamento, qualidade, genética, nutrição e atenção às oportunidades é que farão a diferença.

No exemplo da pecuária de corte o diferencial entre os grupos de produtores de sucesso e os que fracassam na atividade é quem tem excelência na gestão. Os que fazem a lição de casa conseguem avançar e ganhar mais do que no ano anterior ou conseguem manter-se equilibrados em tempos de crise. Quem não se dedica à gestão saboreia algo bem mais amargo. Investir na excelência interna para 2019, quem se mantiver na excelência administrativa continuará sendo premiado pelo próprio esforço. Aumentar ou manter a rentabilidade está muito mais dentro da porteira do que fora. Em análises de qualquer atividade agropecuária se percebe que o produtor terá o mesmo incremento de rentabilidade se aumentar em um certo percentual o ganho médio diário ou se aumentar a densidade de estocagem em uma certa quantidade de gramas ou kg/m2, ou reduzir sua conversão alimentar (exemplos para a Piscicultura). Ainda nessa comparação, registrará a mesma rentabilidade se optar por economizar alguns centavos de R$ por cabeça por ciclo ou conseguir uma valorização de alguns centavos de R$ no preço do kg vendido. Qual opção é mais simples de alcançar? Com certeza, a exemplo dos bovinos, a melhor alternativa serão as iniciativas para melhorar o ganho médio diário e aumento da produtividade por área, o que redundará em redução dos custos de produção. Assim a genética, qualidade e procedência dos alevinos e a nutrição, qualidade da ração, e investimentos em automação e tecnologia é o que pode fazer a diferença e fazer o produtor garantir esse retorno. O ganho individual por animal é pequeno, porém somado a lotes de milhares de animais os ganhos totais serão generosos.

De nada vale tudo isso se os produtores não fizerem sua lição que é o controle e gestão da informação para verificar se está produzindo bem e barato, especialmente controlando seus custos fixos: “A excelência da gestão que gera o lucro é gastar bem, o que é diferente de gastar pouco” (Chaker Neto, 2019). Na Piscicultura, infelizmente o grau de amadorismo na gestão ainda é assustador o que explica esse sentimento de desespero frente às crises sazonais que todo Setor Agropecuário sofre de tempos em tempos, “Lei da Oferta e da Procura”.

Essa crise sazonal que estamos passando tem gerado uma total falta de liquidez para a atividade o que tem criado uma grande instabilidade e insegurança para todo o Setor, uma reação em cadeia e um “Ciclo Vicioso” terrível, afetando a atividade em um momento de consolidação. Essa instabilidade tem trazido uma desconfiança generalizada em muitos investidores e também aos produtores, muitos que já estão há anos na atividade e outros que iniciaram na atividade mais recentemente.

Manter os peixes terminados mais tempo nos tanques esperando preços melhores não é bom negócio, pois os custos de produção aumentam e quem já está no prejuízo só corre mais risco, pois em mercado retraído, matéria prima mais cara é mais difícil de vender, e aí o fluxo de caixa de toda a cadeia fica estagnado, peixe gordo, ração, alevinos, vacinas, insumos, frigoríficos, enfim, tudo para. Consequência disto, aumento nas importações de peixes pelo Brasil, como vimos anteriormente.

A minha previsão é que haverá uma inversão muito significativa neste mercado no final do primeiro semestre e no início do segundo semestre de 2019, pois agora com alguns fatores positivos como a reação da economia brasileira, fruto da sensível recuperação da confiança do mercado, proximidade do período de maior consumo de peixe, semana santa e período da quaresma, os estoques de peixe gordo deverão ser comercializados e esse mercado deverá ter uma boa recuperação, porém os povoamentos com alevinos estão com os fluxos de planejamentos todos atrasados e, pelo menos durante os meses de maio a dezembro deste ano teremos uma escassez de oferta de peixe gordo no Brasil e aí as empresas que se mantiveram firmes em seu planejamento em suas políticas de expansão e mantiveram seus povoamentos em dia ou com poucas adaptações, vão navegar em águas tranquilas em um mercado muito favorável para a venda de peixe gordo e quem não povoou seus tanques no tempo certo, não terá nada para vender.

Mais uma vez vou citar o exemplo das Cooperativas Copacol de CVale no Oeste do Paraná e algumas grandes empresas privadas na Região Leste de Mato Grosso do Sul e Oeste de São Paulo entre outras isoladas em reservatórios em Minas Gerais e São Paulo, as quais apesar das dificuldades de mercado, mantiveram-se firmes em suas políticas de expansão, consolidação de suas marcas junto aos consumidores e desenvolvimento de variedades de produtos é que vão se beneficiar de estarem preparadas para os bons tempos que virão com o aumento da liquidez desse mercado novamente.

Nossa atividade ainda é recente e tem sido muito prejudicada por várias peculiaridades que não deveriam existir, é importante haver uma ação efetiva dos governos Federal e Estaduais para desburocratizar de vez a questão das licenças ambientais, de forma que traga segurança jurídica para a atividade, além desta segurança jurídica poderá colocar a atividade no mesmo patamar de todas as outras atividades agropecuárias nas políticas agrícolas, crédito agrícola, securitização, tributação diferenciada, etc. Essas ações podem trazer um impacto muito significativo para a redução dos custos de produção e melhorar significativamente a competitividade do Setor tanto para que seja mais competitivo no mercado interno quanto para que possamos vir a ser um exportador de produtos da Piscicultura e o mais importante, a exemplo do camarão, descobrirmos o grande mercado interno que temos no Brasil.

Vou finalizar este texto com a mesma mensagem com que finalizei o texto anterior “Não é momento para dúvidas, é momento de investir e acreditar que temos uma atividade segura e que, com certeza, será brevemente uma das mais importantes cadeias produtivas do agronegócio brasileiro, gerando emprego e renda para o Produtor e divisas para o nosso País. Portanto, “pé no acelerador”.”

Dr. Ricardo Pereira Ribeiro, Prof. Associado do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Maringá; Doutor em Ciências.

Fonte: https://www.beefpoint.com.br/fao-qual-a-maior-proteina-da-carne-produzida-mundialmente/

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2 comentários em “PERSPECTIVAS PARA A PISCICULTURA NO BRASIL EM TEMPOS DE CRISE – O QUE PODEMOS ESPERAR OPINIÃO – Ricardo Pereira Ribeiro

  1. muito real sua matéria,parabéns.

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    1. Obrigado Eli, é uma visão que tenho a partir de uma experiência de 30 anos atuando nesta atividade e muito me preocupa o clima de derrotismo que vejo em alguns envolvidos com a atividade. Não é o caminho …

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